sábado, dezembro 10, 2011

O amor é um cão dos diabos

Cerveja




não sei quantas garrafas de cerveja
consumi esperando que as coisas
melhorassem.
não sei quanto vinho e uísque
e cerveja
principalmente cerveja
consumi depois
de rompimentos com mulheres
esperando o telefone tocar
esperando o som dos passos,
e o telefone nunca toca
antes que seja tarde demais
e os passos nunca chegam
antes que seja tarde demais.
quando meu estômago já está saindo
pela boca
elas chegam frescas como flores de primavera:
"mas que diabos você está fazendo?
vai levar três dias antes que você possa me comer!"
a mulher é durável
vive sete anos e meio a mais que o homem,
bebe pouca cerveja porque sabe como ela é ruim para
a aparência.

enquanto enlouquecemos
elas saem
dançam e riem
com caubóis cheios de tesão.

bem, há a cerveja,
sacos e mais sacos de garrafas vazias de cerveja
e quando você pega uma
as garrafas caem através do fundo úmido
do saco de papel
rolando
tilintando
cuspindo cinza molhada
e cerveja choca,
ou então os sacos caem às 4 horas
da manhã
produzindo o único som em sua vida.

cerveja
rios e mares de cerveja
cerveja, cerveja, cerveja.
o rádio toca canções de amor
enquanto o telefone permanece mudo
e as paredes seguem
paradas e estáticas
e a cerveja é tudo o que há.




Charles Bukowski
Ele (LFV) faz o simples sofisticado... 
AMO esse livro.

sexta-feira, dezembro 09, 2011

O corpo e a mente



O corpo e a mente
têm biografias separadas
cada um tem sua memória  própria,
seu próprio jogo de charadas.
Meu corpo tem lembranças
-cheiros, tiques, andanças-
que a mente não registrou
e o corpo não tem as marcas
de metade do que a mente passou.
(Pior que uma mente insana
num corpo sem muito assunto
é um corpo que já foi ao nirvana
sem que a mente tenha ido junto.)
Cada um tem um passado
do qual o outro não tem pista
(como um bilhete amassado)
e nem o Mahabharata
explica uma mente anarquista
num corpo socialdemocrata.
Compartilham bioplasmas
e o gosto por certas atrizes,
mas não tem os mesmos fantasmas
nem as mesmas cicatrizes.
Das duas, uma, gente:
ou toda mente é de outro corpo
-ou todo corpo mente.

Luis Fernando Verissimo