sábado, dezembro 26, 2009


Desejos


Desejo a você
Fruto do mato
Cheiro de jardim
Namoro no portão
Domingo sem chuva
Segunda sem mau humor
Sábado com seu amor
Filme do Carlitos
Chope com amigos
Crônica de Rubem Braga
Viver sem inimigos
Filme antigo na TV
Ter uma pessoa especial
E que ela goste de você
Música de Tom com letra de Chico
Frango caipira em pensão do interior
Ouvir uma palavra amável
Ter uma surpresa agradável
Ver a Banda passar
Noite de lua Cheia
Rever uma velha amizade
Ter fé em Deus
Não Ter que ouvir a palavra não
Nem nunca, nem jamais e adeus.
Rir como criança
Ouvir canto de passarinho
Sarar de resfriado
Escrever um poema de Amor
Que nunca será rasgado
Formar um par ideal
Tomar banho de cachoeira
Pegar um bronzeado legal
Aprender um nova canção
Esperar alguém na estação
Queijo com goiabada
Pôr-do-Sol na roça
Uma festa
Um violão
Uma seresta
Recordar um amor antigo
Ter um ombro sempre amigo
Bater palmas de alegria
Uma tarde amena
Calçar um velho chinelo
Sentar numa velha poltrona
Tocar violão para alguém

Drummond
Além da Terra, além do Céu


Além da Terra, além do Céu,
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastro dos astros,
na magnólia das nebulosas.
Além, muito além do sistema solar,
até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!
vamos conjugar
o verbo fundamental essencial,
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempreamar,
o verbo pluriamar,
razão de ser e de viver.


Drummond

segunda-feira, dezembro 14, 2009

PARADA CARDÍACA

Essa minha secura
essa falta de sentimento
não tem ninguém que segure,
vem de dentro.

Vem da zona escura
donde vem o que sinto.
Sinto muito,
sentir é muito lento.

Paulo Leminski

sábado, dezembro 12, 2009

Poema De Sete Faces


Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.


As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.


O bonde passa cheio de pernas:
Pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos não perguntam nada.


O Homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.


Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.


Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.


Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

Drummond

quinta-feira, novembro 26, 2009



José

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse....
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?

segunda-feira, outubro 26, 2009

Se Puder Sem Medo - Oswaldo Montenegro

Deixa em cima desta mesa a foto que eu gostava
Pr'eu pensar que o teu sorriso envelheceu comigo
Deixa eu ter a tua mão mais uma vez na minha
Pra que eu fotografe assim meu verdadeiro abrigo
Deixa a luz do quarto acesa a porta entreaberta
O lençol amarrotado mesmo que vazio
Deixa a toalha na mesa e a comida pronta
Só na minha voz não mexa eu mesmo silencio
Deixa o coração falar o que eu calei um dia
Deixa a casa sem barulho achando que ainda é cedo
Deixa o nosso amor morrer sem graça e sem poesia
Deixa tudo como está e se puder, sem medo
Deixa tudo que lembrar eu finjo que esqueço
Deixa e quando não voltar eu finjo que não importa
Deixa eu ver se me recordo uma frase de efeito
Pra dizer te vendo ir fechando atrás da porta
Deixa o que não for urgente que eu ainda preciso
Deixa o meu olhar doente pousado na mesa
Deixa ali teu endereço qualquer coisa aviso
Deixa o que fingiu levar mas deixou de surpresa
Deixa eu chorar como nunca fui capaz contigo
Deixa eu enfrentar a insônia como gente grande
Deixa ao menos uma vez eu fingir que consigo
Se o adeus demora a dor no coração se expande
Deixa o disco na vitrola pr'eu pensar que é festa
Deixa a gaveta trancada pr'eu não ver tua ausência
Deixa a minha insanidade é tudo que me resta
Deixa eu por à prova toda minha resistência
Deixa eu confessar meu medo do claro e do escuro
Deixa eu contar que era farsa minha voz tranqüila
Deixa pendurada a calça de brim desbotado
Que como esse nosso amor ao menor vento oscila
Deixa eu sonhar que você não tem nenhuma pressa
Deixa um último recado na casa vizinha
Deixa de sofisma e vamos ao que interessa
Deixa a dor que eu lhe causei agora é toda minha
Deixa tudo que eu não disse mas você sabia
Deixa o que você calou e eu tanto precisava
Deixa o que era inexistente e eu pensei que havia
Deixa tudo o que eu pedia mas pensei que da
va

terça-feira, outubro 20, 2009

Inverno - Adriana Calcanhoto

No dia em que fui mais feliz
Eu vi um avião
Se espelhar no seu olhar até sumir

De lá pra cá não sei
Caminho ao longo do canal
Faço longas cartas pra ninguém
E o inverno no Leblon é quase glacial

Há algo que jamais se esclareceu
Onde foi exatamente que larguei
Naquele dia mesmo
O leão que sempre cavalguei

Lá mesmo esqueci que o destino
Sempre me quis só
no deserto sem saudade, sem remorso só
Sem amarras, barco embriagado ao mar

Não sei o que em mim
Só quer me lembrar
Que um dia o céu
reuniu-se à terra um instante por nós dois
pouco antes do ocidente se assombrar

segunda-feira, outubro 12, 2009

Rosie's Lullaby - Norah Jones

Ela andou até o oceano,
E esperou uma estrela
Levá-la dali

Sentindo-se tão pequena,
No fundo do mundo,
Olhando para cima, para Deus.

Ela tenta respirar fundo,
Para cheirar o mar salgado,
Enquanto ele se mexe sobre seus pés.

A água puxa tão forte,
E ninguém está por perto,
E a Lua está olhando para baixo.

Dizendo,
Rosie - venha comigo,
Feche os olhos - e sonhe.

Os grandes navios estão passando,
E iluminando o céu,
E ela chama por eles, mas eles apenas passam por ela.

As ondas estão quebrando,
Mas não fazem nenhum som,
Apenas mexendo os lábios acompanhando.

Dizendo,
Rosie - venha comigo,
Feche os olhos e sonhe,
Feche os olhos e sonhe,
Feche os olhos e sonhe
Not My Friend - Norah Jones

Me ajude a respirar,
me ajude a acreditar.
Você parece bem satisfeito por eu estar triste.

Você não é meu amigo,
eu não posso fingir que você é.

Você fez com que se tornasse um ferrão,
sua voz está chamando,
assim como os garotos que riam de mim na escola.

Você não é meu amigo,
eu não posso fingir que você é.

Você encontrou um lugar,
onde ninguém deveria ir.

Eu ficarei bem,
porque quando eu voltar,
eu manterei a mira da sua arma na minha vista.

sábado, setembro 26, 2009

Dar não é Fazer Amor


Dar é dar.
Fazer amor é lindo,
é sublime,
é encantador,
é esplêndido,
mas dar é bom pra cacete.

Dar é aquela coisa
que alguém te puxa os cabelos da nuca,
te chama de nomes que eu não escreveria,
não te vira com delicadeza,
não sente vergonha de ritmos animais.

Dar é bom.
Melhor do que dar, só dar por dar.

Dar sem querer casar,
sem querer apresentar pra mãe,
sem querer dar o primeiro abraço no Ano Novo.

Dar porque
o cara te esquenta a coluna vertebral,
te amolece o gingado, te molha o instinto.

Dar porque
a vida de uma publicitária em começo de carreira
é estressante, e dar relaxa.

Dar porque
se você não der para ele hoje,
vai dar amanhã, ou depois de amanhã.

Dar sem esperar ouvir promessas,
sem esperar ouvir carinhos,
sem esperar ouvir futuro.

Dar é bom, na hora.
Durante um mês.
Para as mais desavisadas, talvez anos.

Mas dar é dar demais e ficar vazia.

Dar é não ganhar.
É não ganhar
um eu te amo baixinho perdido no meio do escuro.
É não ganhar uma mão no ombro
quando o caos da cidade parece querer te abduzir.
É não ter alguém pra querer casar,
para apresentar pra mãe,
pra dar o primeiro abraço de Ano Novo e pra falar:
"Que cê acha amor?".

Dar é inevitável,
dê mesmo, dê sempre, dê muito.
Mas dê mais ainda,
muito mais do que qualquer coisa,
uma chance ao amor, esse sim é o maior tesão.
Esse sim relaxa,
cura o mau humor,
ameniza todas as crises e faz você flutuar

Dar é bom
Mas... experimente ser amada."

Verissimo

domingo, setembro 20, 2009

Reflexão nº 1

Ninguém sonha duas vezes o mesmo sonho
Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio
Nem ama duas vezes a mesma mulher.
Deus de onde tudo deriva
E a circulação e o movimento infinito.

Ainda não estamos habituados com o mundo
Nascer é muito comprido.

Murilo Mendes
Distração

Se você não se distrai, o amor não chega
A sua música não toca
O acaso vira espera e sufoca
A alegria vira ansiedade
E quebra o encanto doce
De te surpreender de verdade

Se você não se distrai, a estrela não cai
O elevador não chega
E as horas não passam
O dia não nasce, a lua não cresce
A paixão vira peste
O abraço, armadilha

Hoje eu vou brincar de ser criança
E nessa dança, quero encontrar você
Distraído, querido
Perdido em muitos sorrisos
Sem nenhuma razão de ser

Se você não se distrai,
Não descobre uma nova trilha
Não dá um passeio
Não rí de você mesmo
A vida fica mais dura
O tempo passa doendo
E qualquer trovão mete medo
Se você está sempre temendo
A fúria da tempestade

Hoje eu vou brincar de ser criança
E nessa dança, quero encontrar você
Distraído, querido
Perdido em muitos sorrisos
Sem nenhuma razão de ser

Olhando o céu, chutando lata
E assoviando Beatles na praça
Olhando o céu, chutando lata
Hoje eu quero encontrar você

Tudo Ou Nada
Zélia Duncan

Come on, Baby
Transformar esse limão em limonada
Passar da solidão pra doce amada
Pegar um trem pra próxima ilusão
Come on, Baby
Segurar esse rojão metade cada
Seguir o coração em disparada
Numa estrada que só tem a contramão

Come on, Baby
Arriscar num passe só de palhaçada
Faz de conta que o que conta conta nada
Apostar na falta de exatidão
Come on, Baby
Repartir toda noite em vários dias
Repetir tudo o que seja alegria
E sonhar na corda bamba da emoção

Come on, Baby
Voar sem avião, sem ter parada
Inverso da razão ou tudo ou nada
Fazer durar a chuva de verão

Come on, Baby
Você e eu, luar, beijos, madrugada
A vida não tá certa nem errada
Aguarda apenas nossa decisão

quarta-feira, julho 29, 2009

Mais uma de amor

Que algumas pessoas não acreditem que o homem esteve
mesmo na lua, dá até pra entender, mas tem gente que
não acredita em amor, e isso é imperdoável. Podemos não
acreditar no que nossos olhos vêem, mas não podemos
desacreditar no que sentimos. Você já ficou com a boca
seca diante de uma pessoa? Já teve receio de ela estar
ouvindo as batidas do seu coração? Bem, isso tudo não é
prova de amor, apenas de ansiedade. Amor é outra coisa.

Amor é quando você acha que a pessoa com quem você se
relacionava era egoísta, possessiva e infantilóide e isso não
reduz em nada a sua saudade, não impede que a coisa que
você mais gostaria neste instante é de estar tocando os
cabelos daquela egoísta, possessiva e infantilóide.

Amor é quando você não compreende direito algumas
coisas, mesmo tendo o QI mais elevado da turma, mesmo
dominando o pensamento de Sócrates, Plutão e Nietzche.
Perguntas simples ficam sem resposta, como por exemplo:
como é que eu, sendo tão boa gente, tão honesto e com
um coração tão grande, não consigo fazê-la perceber que
ela seria a pessoa mais feliz do mundo ao meu lado?

Amor é quando você passa dias sem ver quem você ama,
depois passam-se meses, e aí você conhece outra pessoa
e passam-se décadas, e você já nem lembra mais do
passado, e um dia qualquer de um ano qualquer você se
olha no espelho e pensa: como é que eu consegui enganar
a mim mesmo durante todo esse tempo?

Amor é quando você sente que seria capaz de amarrar o
cadarço de um tênis com uma única mão ou de fazer a
chuva parar só com a força do pensamento caso a pessoa
que você ama lhe mandasse um sim deste tamanho.

Amor é quando você sabe tintim por tintim as razões que
impedem o seu relacionamento de dar certo, é quando você
tem certeza de que seriam muito infelizes juntos, é quando
você não tem a menor esperança de um milagre acontecer,
e essa sensatez toda não impede de fazê-lo chorar
escondido quando ouve uma música careta que lembra os
seus 14 anos, quando você acreditava em milagres.

Tudo isso pode parecer uma grande dor, mas é uma grande
dádiva, porque a existência do amor está toda hora sendo
lembrada. Dor é quando a gente está numa relação tão
fácil, tão automática, tão prática e funcional que a gente até
esquece que também é amor.

Martha Medeiros
A dor que dói mais


Trancar o dedo numa porta dói. Bater com o queixo no chão dói. Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé, doem. Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua, dói cólica, cárie e pedra no rim. Mas o que mais dói é saudade.

Saudade de um irmão que mora longe. Saudade de uma cachoeira da infância. Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais. Saudade do pai que já morreu. Saudade de um amigo imaginário que nunca existiu. Saudade de uma cidade. Saudade da gente mesmo, quando se tinha mais audácia e menos cabelos brancos. Doem essas saudades todas.

Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama. Saudade da pele, do cheiro, dos beijos. Saudade da presença, e até da ausência consentida. Você podia ficar na sala e ele no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá. Você podia ir para o aeroporto e ele para o dentista, mas sabiam-se onde. Você podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-la, mas sabiam-se amanhã. Mas quando o amor de um acaba, ao outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.

Saudade é não saber. Não saber mais se ele continua se gripando no inverno. Não saber mais se ela continua clareando o cabelo. Não saber se ele ainda usa a camisa que você deu. Não saber se ela foi na consulta com o dermatologista como prometeu. Não saber se ele tem comido frango de padaria, se ela tem assistido as aulas de inglês, se ele aprendeu a entrar na Internet, se ela aprendeu a estacionar entre dois carros, se ele continua fumando Carlton, se ela continua preferindo Pepsi, se ele continua sorrindo, se ela continua dançando, se ele continua pescando, se ela continua lhe amando.

Saudade é não saber. Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.

Saudade é não querer saber. Não querer saber se ele está com outra, se ela está feliz, se ele está mais magro, se ela está mais bela. Saudade é nunca mais querer saber de quem se ama, e ainda assim, doer.

Martha Medeiros
Esconderijo
Ana Cañas

Procuro a Solidão
Como o ar procura o chão
Como a chuva só desmancha
pensamento sem razão
Procuro esconderijo
encontro um novo abrigo
como a arte do seu jeito
e tudo faz sentido
calma pra contar nos dedos
beijo pra ficar aqui
teto para desabar
você para construir

segunda-feira, julho 27, 2009

Porquinho-da-índia


Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...
- O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.


In “ Estrela da vida inteira”

Manuel Bandeira
O exemplo das rosas


Uma mulher queixava-se do silêncio do amante:
- Já não gostas de mim, pois não encontras palavras para me louvar!
Então ele, apontando-lhe a rosa que lhe morria no seio:
- Não será insensato pedir a esta rosa que fale?
Não vês que ela se dá toda no seu perfume?

Manuel Bandeira
Neologismo

Beijo pouco, falo menos ainda.
Mas invento palavras
que traduzem a ternura mais funda
E mais quotidiana.
inventei, por exemplo, o verbo teadorar.
Intransitivo
Teadoro, Teodora.

Manuel Bandeira

quinta-feira, julho 16, 2009

Via Láctea - Olavo Bilac

Longe de ti; se escuto, porventura,
Teu nome, que uma boca indiferente
Entre outros nomes de mulher murmura,
Sobe-me o pranto aos olhos, de repente...

Tal aquele, que, mísero, a tortura
Sofre de amargo exílio, e tristemente
A linguagem natal, maviosa e pura,
Ouve falada por estranha gente...

Porque teu nome é para mim o nome
De uma pátria distante e idolatrada,
Cuja saudade ardente me consome:

E ouvi-lo é ver a eterna primavera
E a eterna luz da terra abençoada
Onde, entre flores, teu amor me espera.

quarta-feira, julho 15, 2009

Esperando Aviões - Vander Lee


Meus olhos te viram triste
Olhando pro infinito
Tentando ouvir o som do próprio grito
E o louco que ainda me resta
Só quis te levar pra festa
Você me amou de um jeito tão aflito

Que eu queria poder te dizer sem palavras
Eu queria poder te cantar sem canções
Eu queria viver morrendo em sua teia
Seu sangue correndo em minha veia
Seu cheiro morando em meus pulmões
Cada dia que passo sem sua presença
Sou um presidiário cumprindo sentença
Sou um velho diário perdido na areia
Esperando que você me leia
Sou pista vazia esperando aviões

Sou o lamento no canto da sereia
Esperando o naufrágio das embarcações
Dom de Iludir - Caetano Veloso


Não me venha falar
Na malícia de toda mulher
Cada um sabe a dor
E a delícia
De ser o que é...

Não me olhe
Como se a polícia
Andasse atrás de mim
Cale a bôca
E não cale na bôca
Notícia ruim...

Você sabe explicar
Você sabe
Entender tudo bem
Você está
Você é
Você faz
Você quer
Você tem...

Você diz a verdade
A verdade é o seu dom
De iludir
Como pode querer
Que a mulher
Vá viver sem mentir...
Tanto, Tanto - Vander Lee

Eu olho o mundo da janela
Eu vejo um filme além da tela
Os dias passam como por encanto
Eu passo como quem não passa
Sou meio triste e acho graça
Tem tanta gente triste que disfarça
Caminho ao seu lado sem falar
Mas canto uma canção pra te alegrar
Só peço que não tente compreender
Tanto tanto

Dou tudo pelo seu carinho
Mas gosto de ficar sozinho
Olhando da janela do meu quarto
Mas quando vocë chega tarde
Eu quase morro de saudade
Já louco pra fazer suas vontades
Caminho... Tanto, tanto

Nenhum de nós conhece o mundo
O bem, o mal, o céu profundo
No fundo tudo é muito diferente...

sexta-feira, julho 03, 2009

Delírio

Nua, mas para o amor não cabe o pejo
Na minha a sua boca eu comprimia.
E, em frêmitos carnais, ela dizia:
– Mais abaixo, meu bem, quero o teu beijo!

Na inconsciência bruta do meu desejo
Fremente, a minha boca obedecia,
E os seus seios, tão rígidos mordia,
Fazendo-a arrepiar em doce arpejo.

Em suspiros de gozos infinitos
Disse-me ela, ainda quase em grito:
– Mais abaixo, meu bem! – num frenesi.
No seu ventre pousei a minha boca,
– Mais abaixo, meu bem! – disse ela, louca,
Moralistas, perdoai! Obedeci....


Olavo Bilac

sábado, junho 27, 2009

Um beijo

Foste o beijo melhor da minha vida ou talvez o pior...
Glória e tormento,
Contigo a luz subi no firmamento,
Contigo fui pela infernal descida.
Morreste, e o meu desejo não te olvida:
Queimas – me o sangue,
Enches – me o pensamento,
E do teu gesto amargo me alimento,
E rolo – te na boca malferida.
Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo,
Batismo e extrema – unção, naquele instante
Por que feliz, eu não morri contigo?
Sinto – me o ardor e o crepitar te escuto,
Beijo divino! e anseio delirante,
Na perpétua saudade de um minuto.

Olavo Bilac

sexta-feira, junho 26, 2009

Te amei e amei nossa fantasia...

Te amei e amei nossa fantasia
Amei de novo e amei nossa estréia
Amei meu próprio amor e amei a tua audácia
Te amei muito e pouco e comovidamente
Amei a história construída, os ritos, e os porquês
Te amei no invisível, e no inaudível
Amei no crível e no incrível
Amei ser dona e te amei freguês
Te amei e amei a farsa arquitetada
Amei o nosso caso e amei nossa casa
Amei a mim, amei a ti, parti-me ao meio
Te amei no profundo, no raso, e com atraso
Não era tua hora, não era minha vez

Martha Medeiros

sábado, junho 20, 2009

Você Não sabe - Roberto Carlos

Você não sabe quanta coisa eu faria
Além do que já fiz
Você não sabe até onde eu chegaria
Pra te fazer feliz

Eu chegaria
Onde só chegam os pensamentos
Encontraria uma palavra que não existe
Pra te dizer nesse meu verso quase triste
Como é grande o meu amor

Você não sabe que os anseios do seu coração
São muito mais pra mim
Do que as razões que eu tenha
Pra dizer que não
E eu sempre digo sim
E ainda que a realidade me limite
A fantasia dos meus sonhos me permite
Que eu faça mais do que as loucuras
Que já fiz pra te fazer feliz

Você só sabe
Que eu te amo tanto
Mas na verdade
Meu amor não sabe o quanto
E se soubesse iria compreender
Razões que só quem ama assim pode entender

Você não sabe quanta coisa eu faria
Por um sorriso seu
Você não sabe
Até onde chegaria
Amor igual ao meu

Mas se preciso for
Eu faço muito mais
Mesmo que eu sofra
Ainda assim eu sou capaz
De muito mais
Do que as loucuras que já fiz
Pra te fazer feliz

sexta-feira, junho 19, 2009

Condicional - Los Hermanos

Quis nunca te perder
Tanto que demais
Via em tudo o céu
Fiz de tudo o cais
Dei-te pra ancorar
Doces deletérios

Eu quis ter os pés no chão
Tanto eu abri mão
Que hoje eu entendi
Sonho não se dá
É botão de flor
O sabor de fel
É de cortar.

Eu sei é um doce te amar
O amargo é querer-te pra mim
O que eu preciso é lembrar, me ver
Antes de te ter e de ser teu, muito bem

Quis nunca te ganhar
Tanto que forjei
Asas nos teus pés
Ondas pra levar
Deixo desvendar
Todos os mistérios

Sei, tanto te soltei
Que você me quis
Em todo lugar
Lia em cada olhar
Quanta intenção
Eu vivia preso

Eu sei, é um doce te amar
O amargo é querer-te pra mim
Do que eu preciso é lembrar, me ver
Antes de te ter e de ser teu
O que eu queria, o que eu fazia, o que mais?
Que alguma coisa a gente tem que amar, mas o quê?
Não sei mais

Os dias que eu me vejo só
São dias que eu me encontro mais
E mesmo assim eu sei tão bem
existe alguém pra me libertar.

quinta-feira, junho 18, 2009

Trecho de “Amores Interrompidos”

“No entanto, lá no final do livro, quando a relação do casal se limita apenas a uma amizade distante, Beauvoir recupera o tino e escreve coisas interessantes sobre o amor, em especial na carta em que ela consola o amigo por ter sido chutado por uma namorada. Ela disserta sobre a melhor maneira de se enfrentar um rompimento. Naturalmente, a conclusão é que é sempre preferível viver a história até o seu desfecho natural, ou seja, até o desaparecimento do amor, mas dificilmente isso acontece em sincronia. Entre um casal que se separa, há sempre aquele que acaba sendo vítima de um
choque emocional, decorrente da violência que é obrigar-se a matar um sentimento que dentro de si permanece vivo.
Simone de Beauvoir especula que a sensação de perda e a nostalgia do passado costumam durar mais tempo que a própria relação teria durado. É bastante interessante esta teoria: a de que as dores-de-cotovelo duram mais do que o próprio amor, caso este houvesse completado seu ciclo.
Ainda citando Beauvoir, ela diz que a gente se torna mais dependente de um amor quando ele termina, do que enquanto ele dura. Eu não tenho muito a acrescentar, e sim a corroborar. Enquanto estamos vivenciando um amor, não teorizamos a respeito. Só a partir da ruptura é que fazemos um inventário dos ganhos e das perdas, e, por estarmos emocionalmente fragilizados, acabamos por superdimensionar nossa solidão involuntária.
Do que se conclui que o único remédio para a dor de amor é aceitar que as coisas vêm e vão, e que isso é que movimenta a vida. O duro é ter que pensar nisso quando o amor ainda parece que só vai.”

Martha Medeiros
Nada passa

Uma das músicas mais bonitas da MPB é aquela composta por Nelson Motta e Lulu Santos, que diz que na vida tudo passa, tudo sempre passará, como uma onda no mar. Linda. Mas é mentira.
A garota sofrendo o diabo porque brigou com o namorado e a mãe consola com a frase de sempre: vai passar. O garoto levou bomba no vestibular e o melhor amigo diz: na próxima vez você passa. Analisando superficialmente, é verdade, a dor, um dia, cessa. Mas não se iluda: ela não bateu as botas, está apenas cochilando. Tudo passa? Nada passa!
É isso que ninguém tem coragem de nos dizer. A dor da perda, a dor de fracassar, a dor de não corresponder a uma expectativa, a dor de uma saudade, a dor de não saber como agir, de estar perdida, instável, de ter dúvidas na hora de fazer uma escolha, todas estas dores, que parecem pequenas para quem está de fora, nos acompanharão até o fim de nossos dias. Elas não passam. Elas ficam. Elas aninham-se dentro da gente, o que não deve servir de motivo para pularmos de uma ponte. Mario Quintana escreveu que nós somos o que temos e o que sofremos. Sem dor, sem vida interior.
Não passam as dores, também não passam as alegrias. Tudo o que nos fez feliz ou infeliz serve para montar o quebra-cabeça da nossa vida, um quebra-cabeça de cem mil peças. Aquela noite que você não conseguiu parar de chorar, aquele dia que você ficou caminhando sem saber para onde ir, aquele beijo cinematográfico que você recebeu, aquela visita surpresa que ela lhe fez, o parto do seu filho, a bronca do seu pai, a demissão injusta, o acidente que lhe deixou cicatrizes, tudo isso vai, aos pouquinhos formando quem você é. Não há nenhuma peça que não se encaixe. Todas são aproveitáveis. Como são muitas, você pode esquecer de algumas, e a isso chamamos de “passou”. Não passou. Está lá dentro, meio perdida, mas quando você menos esperar, ela será necessária para completar o jogo e se enxergar por inteiro.

Martha Medeiros

terça-feira, junho 16, 2009

Esmolas Afetivas

É dureza levar um fora de quem a gente adora. Parece o fim do mundo, parece que nada pior pode nos acontecer. Mas pode. Pode o querido (vale para as queridas também) Fazer o tipo bom moço e encher você de palavras carinhosas depois do chega pra lá.
Você vai até a farmácia e acaba com o estoque de lenços de papel. O balconista finge não reparar no seu nariz vermelho e nos seus olhos inchados. Aí você volta para casa, liga o computador, abre sua caixa postal e está lá o nome do querido: mensagem para você. Seu coração dispara. Agarra o mouse com força, clica e lê as palavras mais lindas da língua portuguesa. Você foi muito importante pra mim. Jamais vou te esquecer. Foram os melhores dias da minha vida. Não mereço alguém tão perfeita. Seja feliz. Um beijo do sempre seu, Mané.
É um Mané graduado, com PhD em tortura. Deve ter feito um estágio Doi-Codi. Caramba, se ele acha você tão importante, tão perfeita, tão idolatrável, que diabos está fazendo com outra namorada? Por que ele não some do mapa de uma vez? Por que não faz a gentileza de deixar você esquecê-lo
Os dias passam e o cara não escreve mais. Você retoma sua vida, lentamente. Ainda pensa muito nele, mas começa a perceber outras pessoas a sua volta e resolve abrir a guarda para a entrada de um novo amor. Aí, outro e-mail do Mané pousa na sua tela. Por que você anda sumida? Sinto muita saudade. Você é minha melhor amiga, sinto muito carinho por você.
Merece ou não merece um tijolo no meio da testa?
Que papo é este de melhor amiga? Quanto as carinho dele, você embrulha e envia para Guiné-Bissau, alguém lá pode estar precisando. Se ele não pode dizer as coisas que você quer ouvir, que não diga nada. Tudo o que ele consegue com essa lengalenga é fazê-la passar outra temporada na farmácia.
Não estou recomendando grossura. É muito bom saber que a gente foi importante para alguém depois que o romance foi finalizado. Mas cautela aí no politicamente correto. Pessoas apaixonadas querem declarações apaixonadas. A transição de namorada para amiga é muito rápida e indolor quando não há mais paixão. Cabe ao que saiu de cena ter sensibilidade para deixar o outro sofrer em paz, sem alimentar esperanças. Mais tarde, ânimos serenados reconstrói-se a relação em outras bases, se for o caso. Atacar de melhor amigo sabendo que a garota está abalada pode parecer uma atitude bacana, mas é apenas sadismo.

Martha Medeiros

sexta-feira, junho 12, 2009

Transplante de amor

Gastrite é uma inflamação do estômago. Apendicite é uma inflamação no apêndice. Otite é uma inflamação dos ouvidos. Paixonite é uma inflamação do quê? Do coração.
Cada órgão do nosso corpo tem uma função vital e precisa estar 100% em condições. Ao coração, coube a função de bombear sangue para o resto do corpo, ,mas é nele que se depositam também nossos mais nobres sentimentos. Qual é o órgão responsável pela saudade, pela adoração? Quem palpita quem sofre quem dispara? O próprio.
Foi pensando nisso que me ocorreu o seguinte: se alguém está com o coração dilacerado nos dois sentidos, biológico e emocional, e por ordens médicas precisa de um novo, o paciente irá se curar da dor de amor ao receber o órgão transplantado?
Façamos de conta que sim. Você entrou no hospital com o coração em frangalhos, literalmente. Além de apaixonado por alguém que não lhe dá a mínima, você está com as artérias obstruídas e os batimentos devagar quase parando. A vida se esvai, mas localizam um doador compatível: já para a mesa de cirurgia.
Horas depois, você acorda. Coração novo. Tum-tum, Tum-tum, Tum-tum. Um espetáculo. O médico lhe dá uma sobrevida de cem anos. Nada mal. Visitas entram e saem do quarto, Até que anunciam o Jorge. Que Jorge? O Jorge, minha filha, o homem que você sempre amou. Eu????
Você não reconhece o Jorge. Acha ele meio baixinho. Um tom de voz estridente. Usa uma camisa cor – de laranja que não lhe cai bem. Mas foi você mesma que deu a ele de aniversário, minha filha. Eu????
Seu coração ignorou o tal Jorge. O mesmo Jorge que quase lhe levou à loucura, o mesmo Jorge que fez você passar noites insones, que fez você encher uma piscina olímpica de lágrimas. Em compensação, aquele enfermeiro ali é bem gracinha. Tem um sorriso cativante. E uma mão que é uma pluma, você nem sentiu a aplicação da anestesia. Bacana este cara. Quem é? O namorado da menina a quem pertencia seu coração. Tum-tum, Tum-tum, Tum-tum.
Transplantes de amor, Garanto que fariam muito mais sucesso que a safena.

Martha Medeiros
Ismália

Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...


Alphonsus de Guimarães

quinta-feira, junho 11, 2009

Ausência

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

Drummond
Tristeza no céu

No céu também há uma hora melancólica.
Hora difícil, em que a dúvida penetra as almas.
Porque fiz o mundo? Deus se pergunta
e se responde: Não sei.

Os anjos olham-no com reprovação,
e plumas caem.Todas as hipóteses: a graça, a eternidade, o amor
caem, são plumas.

Outra pluma, o céu se desfaz.
Tão manso, nenhum fragor denuncia
o momento entre tudo e nada,
ou seja, a tristeza de Deus.


Drummond
Amor é bicho instruído

Amor é bicho instruídoOlha: o amor pulou o muro
o amor subiu na árvore
em tempo de se estrepar.
Pronto, o amor se estrepou.
Daqui estou vendo o sangue
que escorre do corpo andrógino.
Essa ferida, meu bem
às vezes não sara nunca
às vezes sara amanhã.

Drummond
Não sei Dançar

''Uns tomam éter, outros cocaína.
Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria.
Tenho todos os motivos, menos um, de ser triste''

Manuel Bandeira
Ao Amor Antigo

O amor antigo vive de si mesmo,
não de cultivo alheio ou de presença.
Nada exige nem pede. Nada espera,
mas do destino vão nega a sentença
.O amor antigo tem raízes fundas,
feitas de sofrimento e de beleza.
Por aquelas mergulha no infinito,
e por estas suplanta a natureza.
Se em toda parte o tempo desmorona
aquilo que foi grande e deslumbrante,
a antigo amor, porém, nunca fenece
e a cada dia surge mais amante.
Mais ardente, mas pobre de esperança.
Mais triste? Não.Ele venceu a dor,
e resplandece no seu canto obscuro,
tanto mais velho quanto mais amor.

Drummond
Incompatibilidade - Oswaldo Montenegro

E bate louco, bate criminosamenteO coração mais do que a mente, bate o pé mais do que o corpo poderiaE se você mentalizasse na foliaSabe lá se não seria a solução pra de manhã pensar melhorE caso fosse a incompatibilidade entre o corpo e consciênciaIria desaparecer, você não vêComo o corpo preparado pode ser iluminadoComo a luz de uma fogueira que precisa se manterE atingido pela plena consciênciaDe que o corpo em decadência faz a tua consciência esmorecerPelos poros elimina-se o que o povo não precisaE não precisa pra pensar, abdicar desse prazerSe você dançar a noite inteira não significa dar bobeiraDe manhã se alienar ou esquecerÉ a busca do supremo equilíbrio, num processo inteligente sua menteclarear sem perceberE a intelectualidadePode Dançar sem receioDescanso é pra alimentarE trabalhar sem anseioEu tô olhando pra pontaMas não esqueço do meioQuem acha o corpo uma ofensaFalo sem demagogiaPode dançar essa noiteE amanhã pensar quem diriaQem não entendeu eu lamentoEspero que entenda algum dia aaahhhhhhE bate loco bate criminosamente...

sexta-feira, fevereiro 13, 2009

Estrada Nova
Oswaldo Montenegro


Eu conheço o medo de ir embora
Não saber o que fazer com a mão
Gritar pro mundo e saber
Que o mundo não presta atenção
Eu conheço o medo de ir embora
Embora não pareça, a dor vai passar
Lembra se puder
Se não der, esqueça
De algum jeito vai passar
O sol já nasceu na estrada nova
E mesmo que eu impeça, ele vai brilhar
Lembra se puder
Se não der esqueça
De algum jeito vai passar
Eu conheço o medo de ir embora
O futuro agarra a sua mão
Será que é o trem que passou
Ou passou quem fica na estação?
Eu conheço o medo de ir embora
E nada que interessa se pode guardar
Lembra se puder
Se não der esqueça
De algum jeito vai passar

sábado, fevereiro 07, 2009

Norah Jones

Norah Jones - One Flight Down (tradução)

Um vôo baixo Há uma pequena canção E sua mente apenas captou o som Agora você sabe que está errado Porque vaga como fumaça E estará lá tocando continuamente Agora você sabe Agora você sabe
A flauta e a gaita vem tecendo, Seduzindo em uma única nota
Neste lugar Onde seus braços desdobram Aqui ao menos você vê seu antigo rosto Agora você sabe Agora você sabe
O ritmo toca suavemente imperfeito Toca-o novamente e então se vai
Um vôo baixo Há uma pequena canção E estará lá tocando continuamente Agora você sabe Agora você sabe

Encostei-me a ti sabendo que eras somente onda.
Sabendo bem que eras nuvem, depus a minha vida em ti.
Como sabia bem tudo isso, e dei-me ao teu destino frágil,
Fiquei sem poder chorar quando caì.

Cecília Meireles

Tenho tanto sentimento Que é freqüente persuadir-me De que sou sentimental, Mas reconheço, ao medir-me, Que tudo isso é pensamento, Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos, Uma vida que é vivida E outra vida que é pensada, E a única vida que temos É essa que é dividida Entre a verdadeira e a errada.
Qual porém é a verdadeira E qual errada, ninguém Nos saberá explicar; E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem É a que tem que pensar.

Fernando Pessoa, 18-9-1933
Amar!Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui... além...Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma primavera em cada vida:É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!
E se um dia hei de ser pó, cinza e nada,
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...

Autor Desconhecido

O Último Poema

Assim eu queria o meu último poema
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação



Manuel Bandeira

Análise

Tão abstrata é a idéia do teu ser
Que me vem de te olhar, que, ao entreter
Os meus olhos nos teus,perco-os de vista,
E nada fica em meu olhar, e dista
Teu corpo tão longemente,
E a idéia do teu ser fica tão rente
Ao meu pensar olhar-te, e ao saber-me
Sabendo que tu és, que, só por ter-me
Consciente de ti, nem a mim sinto.
E assim, neste ignorar-me a ver-te, minto
A ilusão da sensação, e sonho,
Não te vendo, nem vendo, nem sabendo

Fernando Pessoa

Posso escrever os versos mais tristes esta noite
Escrevr por exemplo: "A noite tem estrelas, e, azuis, os astros tiritam na distância."
O vento nocturno gira o céu e canta
Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Eu amei-a e por vezes, ela também me quis.
Em noites como esta tive-a nos meus braços.
Beijei-a tantas vezes sob o céu infinito.
Ela me quis e por vezes, ela também me quis.
Como não ter amado seus grandes olhos firmes?
Posso escrever os versos mais tristes esta noite
Pensar que não a tenho. E sentir que a perdi.
Ouvir a note imensa, mais imensa sem ela.
E o verso que cai na alma qual prado o rocio.
Que importa que o meu amor não pudesse guardá-la!
A noite tem estrelas e ela não esta comigo.
A mesma noite que faz branquear as mesmas árvores.
Porém, nós já não somos os mesmos desses dias
Já não lhe quero, é certo, mas quanto amor lhe tive !
Minha voz buscava o vento para tocar seus ouvidos.
De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos.
Sua voz, seu corpo claro. Seus olhos infinitos.
Já não lhe quero, é certo, mas talvez ainda lhe queira.
É tão breve o amor, é tão longo o olvido.
Porque em noites como esta tive-a nos meus braços,
minha alma não se conforma com havê-la perdido.
Embora esta seja a última dor que ela me causa,
e estes sejam os últimos versos que lhe escrevo.

PABLO NERUDA


Soneto a quatro mãos
Tudo de amor que existe em mim foi dado
Tudo que fala de amor em mim foi dito
Do nada em mim o amor fez o infinito
Que por muito tornou-se escravizado
Tão pródigo de amor fiquei coitado
Tão fácil para amar fiquei proscrito
Cada voto que fiz ergueu-se em grito
Contra o meu próprio dar demasiado
Tenho dado de amor mais que coubesse
Nesse meu pobre coração humano
Desse eterno amor meu antes não desse
Pois se por tanto dar me fiz engano
Melhor fora que desse e recebesse
Para viver da vida o amor sem dano

Vinicius de Moraes

Ao Amor Antigo
O amor antigo vive de si mesmo, não de cultivo alheio ou de presença.

Nada exige nem pede.
Nada espera,mas do destino vão nega a sentença.
O amor antigo tem raízes fundas,feitas de sofrimento e de beleza.
Por aquelas mergulha no infinito,e por estas suplanta a natureza.
Se em toda parte o tempo desmoronaaquilo que foi grande e deslumbrante,a antigo amor, porém, nunca fenecee a cada dia surge mais amante.
Mais ardente, mas pobre de esperança.Mais triste? Não.
Ele venceu a dor,e resplandece no seu canto obscuro,tanto mais velho quanto mais amor.

Drummond